8.1.14

Roberto de Copacabana

Prólogo:
Eu estava num grupo terapêutico, no CAPS, lá as coordenadoras do grupo perguntavam como os pacientes estavam se sentindo, como tinha sido a semana, etc. A coordenadora do grupo perguntou a um senhor bem vestido como ele estava:
- Estou bem. - Disse ele, com um sorriso.
Depois ela me perguntou como eu estava e eu falei sobre o meu trabalho pela ONG de informática.
Lágrimas brotaram discretamente nos olhos do senhor bem vestido. Num determinado momento ele não podia mais esconder as lágrimas, e as coordenadoras perguntaram o que tinha acontecido:
- Nada. Eu só gostaria de estar trabalhando, como ele. Disse ele apontando para mim. - Minha vida está parada.
Na hora eu pensei: "ele não tem ideia do inferno que eu passo nesse meu trabalho. Ele não tem ideia de como alguns funcionários do CAPS simplesmente dificultam meu trabalho aqui por puro ciúme. Ele não tem ideia de que se não fosse por ele eu nem estaria aqui."
Eu evidentemente não poderia dizer isso a ele, pois só o deixaria pior. Eu apenas disse o que eu via nele: que ele era claramente muito mais capaz que eu e que certamente logo arrumaria um trabalho. Foi o que aconteceu. Ele era engenheiro e logo arrumou um trabalho. Quando ele disse no grupo posteriormente que ele tinha arrumado um trabalho eu apenas sorri e pensei: "Meu Deus! Como as pessoas se preocupam por tão pouco e enquanto se preocupam com pouco acabam se esquecendo de olhar para outros que são, de fato, muito necessitados."
Entre esses necessitados está o Roberto. Mas o Roberto não precisava de dinheiro ou de trabalho, pois Roberto morava num apartamento na Barata Ribeiro, em Copacabana. Nenhum pobre tem condições de morar em uma das ruas principais de Copacabana, na zona sul do Rio de Janeiro. Ele precisava de carinho sincero, pois amor é a única coisa que não pode ser artificial, não se pode fingir amar. Infelizmente, pessoas como o Roberto tiveram carência de amor verdadeiro quando crianças.


Roberto de Copacabana
Eu me lembrei do Roberto de Copacabana recentemente, quando um rapaz se aproximou de mim e me pediu que comprasse algo para ele comer. A vestimenta dele era muito melhor do que a minha, de tal forma que eu acho que eu que deveria estar pedindo para ele me pagar alguma coisa. Mas, por outro lado, sua auto-estima estava lá embaixo.

- Me arruma um dinheiro para mim comprar um café, seu moço. Me arruma um dinheiro para mim comprar um café, seu moço! Arruma aí! - Dizia o Roberto, começando implorando, e por fim pedindo de uma forma mais agressiva, mas sempre com a voz quebrada de quem já perdeu toda a auto-estima.

Roberto era chamado de louco. Assim como a moça que chegou no balcão da farmácia em que eu trabalhava e começou a conversar com o pessoal. Ela disse que tinha acabado de sair do Pinel, mas ela estava bonita, estava bem vestida! Meus colegas de trabalho se divertiam fazendo perguntas embaraçosas a ela. Ela respondia com lucidez, mas, pelo jeito, já não tinha mais motivos para se sentir embaraçada com nada. E isso instigava as pessoas a fazer perguntas cada vez mais invasivas!

Roberto era conhecido por praticamente todo mundo que morava ou trabalhava próximo às ruas Barão de Ipanema, Bolívar, Xavier da Silveira e Miguel Lemos.

Roberto morava num apartamento na Barata Ribeiro, em Copacabana; eu morava num bairro pobre da baixada, numa rua sem asfalto, sem saneamento básico, e sem colheita de lixo. Ele me pedia dinheiro, mas eu pensava que eu que deveria estar pedindo dinheiro a ele! Roberto vagava pelas ruas de Copacabana, sem encarar as pessoas, mirando o chão. Há poucos meses eu o encontrei em Copacabana, e observei que ele tinha se tornado corcunda. Ainda não o era quando eu o conheci em 1990. Creio que não é necessário dizer porque ele se tornou corcunda. Essas pessoas têm posses materiais ao ponto que as permitiriam viver com dignidade. Mas a auto-estima delas foi destruída pela falta de amor familiar. Talvez seus familiares já não estejam mais nesse mundo, e não tenham a menor ideia do que a falta de amor fez com essas pessoas. Essas pessoas hoje em dia são chamadas de "malucas".

Para quem chama esses sofredores de "malucos" eu deixo uma pergunta:
Se essas pessoas são "malucas", não deveriam serem tratadas em vez de insultadas? Pois essas pessoas estão abandonadas pelo estado, pela família e pela comunidade. Lógico, quando eu falo em tratamento não estou dizendo que essas pessoas deveriam estar tomando psicotrópicos, isoladas num hospital psiquiátrico ou num "centro de atenção psicossocial". Pois se pegarem uma pessoa e a colocarem numa instituição e começarem a forçá-la a tomar psicotrópicos é LÓGICO que a auto-estima dessa pessoa baixará mais ainda. Não adianta colocar uma pessoa num "centro de atenção psicossocial", mas cada vez que essa pessoa reclamar de alguma coisa, dizer que essa pessoa está de frescura ou de palhaçada. Foi esse tipo de tratamento que eu vi nos hospitais psiquiátricos e nos "centros de atenção psicossocial".


Epílogo:
Mas quem sou eu para falar de amor, quando eu tive a infância mais sem amor que eu já ouvi falar? De fato, desde cedo eu percebi que a falta de amor teria consequências terríveis para mim. Por isso eu comecei a estudar o amor, da mesma forma que estudei artes marciais e idiomas. O aprendizado autodidata teve consequências que a maioria das pessoas não têm, pois a maioria das pessoas aprenderam a se relacionar. E aprenderam a se relacionar melhor, porque não precisavam se preocupar em aprender a amar. Para se relacionar é necessário deixar o amor de lado um pouco para conquistar. Conquistas não são baseadas em amor, são baseadas em astúcia e habilidade. O amor verdadeiro deve evitar qualquer astúcia. Para aprender o amor sozinho, eu tive que estudar e me dedicar mais que qualquer outro, como tive que fazer com todas as coisas que aprendi sozinho. Infelizmente isso teve uma consequência: eu me tornei um solitário como nenhum outro, um solitário no meio de uma multidão. Como se pode ver, a consequência da falta de amor para mim não é a solidão. A solidão foi consequência de aprender a amar só, pois aprendi a amar todos sem distinção, e quem ama todos sem distinção nem precisa esperar ser correspondido, e quando é correspondido, fica sem jeito, e com medo de decepcionar, por não ter a astúcia necessária para um bom relacionamento. Apesar de amar sem distinção, eu gostaria de passar minha vida com uma mulher, em particular, já que o amor sensual é diferente do amor altruísta. A consequência da falta de amor altruísta para mim, em particular, seria um manipulador cheio de amigos e namoradas, sem amar de verdade nenhum deles. Entre ser um manipulador e ser um solitário, prefiro ser solitário.

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